CONVIVER COM A PSA (CANCRO BACTERIANO DO KIWI) – UM DESAFIO PERMANENTE
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Eva Garcia e Joana Costa
FitoLab – Laboratório de Fitossanidade do Instituto Pedro Nunes, Coimbra e Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra
CONVIVER COM A PSA (CANCRO BACTERIANO DO KIWI) – UM DESAFIO PERMANENTE
A produção de kiwi (Actinidia sp.) é uma importante atividade económica em diversos países, tendo apresentado uma expansão mundial nos últimos anos. Em Portugal, esta atividade teve início a partir da década de 1990 e tem sido alvo de um crescente investimento correspondendo ao sector agroalimentar que mais tem crescido nos últimos anos, contribuindo de forma decisiva para a redução do défice comercial do sector, comprovado pelo notável aumento das exportações. Todavia, tendo a área de produção aumentada consideravelmente, a produtividade tem diminuído, sendo apontada a infeção pela bactéria Pseudomonas syringae pv. actinidiae (Psa) como uma das principais causas (FAO, 2016).
A Psa é o agente causal do cancro bacteriano do kiwi, considerada a doença mais grave desta cultura, manifestando elevada agressividade e uma dispersão muito rápida, tendo, nos dias de hoje, distribuição generalizada nas regiões produtoras. Esta doença, detetada em Portugal em 2010, pode, em casos mais virulentos, causar a morte das plantas, colocando em causa a sustentabilidade da Fileira, sendo atualmente considerada a maior causa de perdas na produção de kiwi a nível mundial, provocando importantes prejuízos económicos nos principais países produtores de kiwi. Estudos recentes indicam que Portugal, Itália e a Grécia, são zonas altamente suscetíveis para o desenvolvimento da doença devido às suas condições edafo-climáticas, que se tornarão cada vez mais favoráveis face às alterações climáticas que se traduzirão em invernos mais suaves, permitindo que os sintomas se tornem permanentes ao longo do ano. A Psa pode infetar tanto Actinidia deliciosa como A. chinensis, onde causa perdas económicas consideráveis. Foi também isolada em A. arguta e A. Kolomikta (EPPO, 2011).
Os sintomas da doença variam ao longo do ano. No início da primavera o sintoma mais visível é a produção de um exsudado avermelhado (Figura a) associado a cancros e feridas nos troncos e ramos infetados. No caso de não haver exsudado, pode ser observada uma coloração vermelha-acastanhada por baixo da casca (Figura b).
Embora seja mais difícil de detetar, pode ainda ocorrer a formação de gotas de exsudado branco nos tecidos antes da floração e no verão. Durante a primavera e verão podem ainda surgir pequenas manchas necróticas angulares nas folhas, podendo apresentar ou não, um halo amarelo. Estas manchas podem acabar por se juntar, formando necroses castanhas de maiores dimensões (Figura c). Surgem frequentemente necroses castanhas nos botões florais, que podem levar ao abortamento floral, impedindo assim a formação de fruto (Figura d).
Também um importante sinal de que o pomar pode estar infetado com Psa é a morte repentina de plantas, com a parte aérea da planta a murchar em poucos dias. No verão os ramos podem começar a secar a partir do meio, presumivelmente o local onde a bactéria terá penetrado no tecido, secando posteriormente em ambas as direções com a consequente morte do fruto. No final do verão e durante o outono podem formar-se cancros nos troncos e nos ramos. Alguns sintomas desta doença não são específicos, o que dificulta a sua identificação no campo. Por exemplo, a morfologia das manchas nas folhas e as necroses nas flores causadas pela Psa são semelhantes às causadas por outras bactérias patogénicas da actinídea como Pseudomonas syringae pv. syringae ou Pseudomonas viridiflava, mas que não causam a morte das plantas. De entre os sintomas descritos, os que parecem ser mais específicos de Psa são a produção de exsudados brancos e avermelhados e a morte dos rebentos no verão. A Psa pode colonizar a planta aparentemente em qualquer altura do ano, no entanto, as épocas mais favoráveis são o fim do inverno, início da primavera e o outono, dado que as condições de temperatura e humidade são mais favoráveis associadas à realização de operações culturais que promovem a sua penetração na planta (Vanneste et al., 2011).
A dispersão da Psa a pequenas distâncias, dentro de um pomar ou entre pomares vizinhos, ocorre através da disseminação dos exsudados existentes em plantas infetadas, pela fricção entre folhas de plantas infetadas e plantas saudáveis, pelo vento, pela chuva, pelo pólen, por insetos e por práticas culturais, nomeadamente utilização de ferramentas não desinfetadas. Tendo em vista a limitação da dispersão da Psa, a EPPO (European and Mediterranean Plant Protection Organization) adicionou em 2009 a doença à lista de alerta A2, lista que inclui os organismos recomendados para regulação como organismos de quarentena. Para esse efeito, passou a ser necessário um certificado fitossanitário de plantas ou pólen que tenham origem em países fora da União Europeia. Para movimentação de plantas entre estados membros, passou a ser obrigatório um “passaporte fitossanitário” que garanta que as plantas têm origem num local onde a doença não está presente e que foram testadas para a presença de Psa (Vanneste, 2013).
Apesar de todos estes esforços não tem sido possível conter esta doença uma vez que não existem métodos de luta curativos disponíveis, e as regiões afetadas têm aumentado sucessivamente nos últimos anos, com o crescente aumento das perdas associadas.
A actinídea pode também ser afetada por fungos responsáveis por danos acentuados, incluindo a morte das plantas. De entre os mais severos e globalmente distribuídos refere-se a “podridão agárica” causada por Armillaria spp., a “podridão radicular” causada por Phytophthora spp., a “podridão cinzenta” cauda por Botrytis cinerea e a “esca” provocada por um complexo de fungos. A actinídea é frequentemente atacada também por nemátodes da família Meloidogyne spp.
Torna-se assim imperativo realizar despistes para as doenças que afetam os pomares por forma a adoptar as medidas de gestão mais adequadas. Estas incluem a adoção de medidas que mitiguem os efeitos causados pelas doenças, bem como a aposta na prevenção da introdução. Um ponto crucial são os cuidados a ter aquando da instalação de novos pomares, que passam não só pela seleção de plantas de elevada qualidade fitossanitária, mas também pela adequada preparação do solo, quer do ponto de vista abiótico quer biótico, bem como a gestão dos reservatórios ambientais onde estão presentes estes organismos.
Foi neste contexto, e dando resposta aos principais desafios da fileira do kiwi que surgiu o Grupo operacional- I9K InovKiwi coordenado pelo FitoLab do Instituto Pedro Nunes. O I9K pretende dar resposta a lacunas existentes que são transversais à fileira do Kiwi, através da divulgação, disseminação e demonstração de processos e produtos que visam minimizar o risco de dispersão de Psa e mitigação dos seus efeitos, identificar variedades de actinídea adaptadas às condicionantes edafo-climáticas regionais, selecionadas através das suas melhores performances produtivas e de resistência/tolerância à Psa, e aumento da produtividade através da obtenção de pólen de qualidade e de métodos de aplicação mais eficazes.
Os resultados a atingir pelo I9K têm um elevado fator de inovação e de internacionalização através da introdução de novos produtos no mercado bem como através da implementação de novos processos. Uma vez que no I9K está representa 95% da fileira, os resultados obtidos serão amplamente difundidos tendo um impacto real no aumento da produtividade e na redução dos custos de produção.
Fontes
Food and Agricultural Organization. (2016). http://www.fao.org/faostat/en/#data/QC
European and Mediterranean Plant Protection Organization (EPPO). (2016)
https://www.eppo.int/QUARANTINE/Alert_List/bacteria/P_syringae_pv_actinidiae.htm
Vanneste, J.L. et al. 2011. Recent advances in the characterization and control of Pseudomonas syringae pv. actinidiae, the causal agent of bacterial canker on kiwifruit. . In VII International Symposium on Kiwifruit, Costa, G. e Ferguson, International Society for Horticultural Science, Faenza, 443-455.
Vanneste,
J. L., 2013. Development of control strategies for Pseudomonas syringae pv .
actinidiae. Plant
& Food Research, 37 pp